Como de costume, o Papa Francisco conversou com os jornalistas no voo de volta para Roma nesta segunda-feira, 30, após sua
viagem de seis dias à África. Entre os temas abordados, o caso vatileaks, guerras, fundamentalismo e meio ambiente, em vista da COP21.
Vatileaks
A respeito do processo em andamento no Vaticano em virtude do recente
vazamento de documentos reservados do Vaticano, caso conhecido como
“vatileaks 2”, o Papa admitiu que se cometeu um erro ao confiar no padre
Vallejo Balda e em Francesca Chaouqui – dois dos acusados – que no
início do mês foram detidos por furto e divulgação de notícias e
documentos confidenciais.
O Papa contou, no entanto, que todo este caso não foi uma surpresa
para ele. “Não me tirou o sono, porque foi divulgado o trabalho que se
começou a fazer com a Comissão de Cardeais – o C9 – justamente para
encontrar casos de corrupção e coisas que não vão bem”.
Francisco recordou que as denúncias sobre a “sujeira” na Igreja
remontam ao fim do pontificado de João Paulo II, quando o então Cardeal
Joseph Ratzinger tomou “a liberdade de dizer as coisas”. “Desde esse
tempo, anda no ar a ideia de que há corrupção no Vaticano”, acrescentou.
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Em relação ao julgamento, o Papa disse que gostaria que acabasse
antes do início do Jubileu da Misericórdia (8 de dezembro). Ele recusou a
ideia de que a acusação aos dois jornalistas envolvidos seja um ataque
da Santa Sé à liberdade de imprensa.
“O fundamental é ser realmente profissional; que as notícias não
sejam manipuladas. Isto é importante, porque denunciar injustiças e
corrupção é um belo trabalho”, disse, elencando três pecados mais comuns
que a imprensa não deve cometer: a desinformação, a calúnia e a
difamação.
Fundamentalismo
Questionado sobre o fundamentalismo religioso e a atuação dos líderes
políticos, o Papa criticou a rede de interesses que se esconde atrás
dos conflitos bélicos, em sua opinião provocados pelo dinheiro e o
poder.
Francisco destacou ainda que não se pode rechaçar uma religião porque
há grupos fundamentalistas. “Também os cristãos devem pedir perdão por
fatos do passado”. Neste sentido, recordou Catarina de Médici e a
matança promovida em Paris no século XVI, conhecida como “o massacre de
São Bartolomeu” e completou: “O saque de Roma não foi feito pelos
muçulmanos!”.
“O fundamentalismo é uma doença que existe em todas as religiões. Nós
católicos temos alguns: não alguns, tantos né, que acreditam estar com a
verdade absoluta e vão adiante contaminando os outros com a calúnia, a
difamação e fazem mal. E isso eu digo porque é a minha Igreja. E se deve
combater. O fundamentalismo religioso não é religioso. Por que? Porque
falta Deus. É idolátrico, como é idolátrico o dinheiro”.
COP21
O aquecimento climático põe o mundo à beira do suicídio, disse o Papa
ao responder a uma pergunta sobre a Conferência do Clima, que começou
ontem em Paris. O jornalista perguntou se o Papa acredita que o evento é
o início da solução.
“Não estou seguro, mas o que posso dizer é que agora ou nunca se deve
atuar diante das mudanças climáticas”, declarou. “Desde a conferência
de Quioto, em 1991, pouco foi cumprido e a cada ano, os problemas são
mais graves, enquanto tudo parece indicar, empregando uma palavra forte,
que estamos à beira do suicídio. A quase totalidade daqueles que estão
em Paris querem fazer algo. Tenho confiança de que o farão, têm boa
vontade e rezo por eles”, completou.
Uso de preservativo no combate à Aids
Outra pergunta feita no voo foi a respeito da oposição da Igreja
católica em relação ao uso de preservativo no combate à Aids. Nesta
terça-feira, 1º, celebra-se o Dia Mundial de Luta contra a doença.
Francisco disse que a pergunta parece limitada e parcial, pois o
problema é bem maior do que aquilo que o jornalista expôs na pergunta:
se a Igreja não deveria permitir o uso de preservativo para prevenir o
contágio pela doença.
“O problema é maior. Essa pergunta me faz pensar naquilo que Jesus
fez: ‘Diga-me, Mestre, é lícito curar de sábado?’. É obrigatório curar!
Essa pergunta, se é lícito curar assim…mas a má nutrição, a exploração
das pessoas, o trabalho escravo, a falta de água potável: esses são os
problemas. Não falamos se se pode usar esse ou aquele curativo para uma
pequena ferida. A grande ferida é a injustiça social, a injustiça do
ambiente, da exploração e da má nutrição”.